quarta-feira, 3 de março de 2010

Como dar uma bomba a um terrorista

Ontem à noite vi o filme Ninja Assassin.
Mal vi o genérico de abertura e os meus olhos já tinham aumentado para o dobro e lacrimejavam abundantemente, enquanto me encolhia de excitação no sofá, de forma a que os joelhos me tocavam o queixo.

É o típico filme de pancada com místicas inventadas, clãs de ninjas, espadas e lutas em slow-motion, imenso sangue e completo desrespeito pela lei da gravidade e mais umas quantas da física e até da realidade. Adorei cada segundo.

Nas primeiras cenas consegui conter-me, e apenas gritei uns sonoros "UAU's!".
Com o desenrolar do filme, e já mais descontrolado, alternava entre uns espécies de ataques musculares violentos no sofá, ou andar pelo chão de casa a rebolar e aos saltos com uma vassoura.

Como devem imaginar o meu nível de entusiasmo era evidente.
Felizmente o meu colega partilhava desse meu entusiasmo frenético, então a modos que passamos o filme todo a falar do personagem principal (o Raízo), como se ele fosse a encarnação do Martin Luther King dos pontapés no cu.

Frases e diálogos deste género foi coisa que não faltou:
"- UAU, viste aquilo? O gajo arrancou-lhe os intestinos e depois decorou a árvore de Natal com eles! E nem sequer é Natal! UAU!"
"- Ei, este que apareceu agora é lixado! O Raízo vai-se ver à rasca!"
"- Ui, que técnica. Cuidado Raízo, esse é melhor que os outros!"

Já falávamos como se fossemos todos amigos de longa data, e secretamente desejava-mos ambos também ter sido abandonados à nascença e treinados por um clã ninja para matar tudo o que se mexesse e para ficar invisível nas sombras.
Outras vezes, limitava-mo-nos a olhar um para o outro com um sorriso parvo e olhos de carneiro-mal-morto (os meus ainda vermelhos do choro inicial), e faziamos um ligeiro aceno de cabeça em sinal de aprovação, sempre que era levada a cabo uma execução particularmente violenta ou espectacular.
E outras vezes ainda, testamos a sala onde estávamos, procurando cantos mais escuros onde nos aninhávamos e depois perguntávamos "então, consegues-me ver?!".

Foi, em suma, um filme excelente para qualquer fã da guerra oculta.

Quando terminou, e eu recomecei a ganhar a sensibilidade nos membros devido a todo aquele esforço físico requerido para o decorrer do filme, o meu colega perguntou:

- Então André, gostaste?
- O meu nome é Raízo, mestre das sombras.
- Nem penses, o Raízo sou eu!
- Não és digno! Aposto que nem sabes quantos outros ninjas é que ele matou no filme!
- 673, ha!
- Raios!

E foi então que começou uma discussão acesa para decidir quem efectivamente é que era Raízo, o mestre das sombras.
Como não chegamos a nenhum entendimento, e imbuídos do espírito do filme, resolvemos fazer um duelo ninja para verificar quem é que era digno de envergar tal nome.
Uma vez que não tínhamos katanas e shuriken a pontapé, tivemos que nos contentar com o que havia: duas colheres-de-pau e palitos.

Lá nos engalfinhamos um no outro, tentando desajeitadamente espancar a testa do adversário com a colher de pau, e a atirar palitos um ao outro.
Volta e meia, quando achávamos que estávamos numa sombra, ficavamos inertes, de pé, achando imbecilmente que estávamos ocultos e invisíveis, o que valia mais um colherada bem assente.

Obviamente acabámos os dois no hospital, a dar a sensação que tínhamos sido alvo de um ataque de um clã de croquetes-ninja, tal era a quantidade de palitos que tínhamos espetados no corpo todo. Palitos esses que ainda estou para compreender como chegaram a locais tão recônditos.
Mas nem a caminho desistimos de ser ninjas, e tentava-mos constantemente evitar as luzes dos candeeiros do passeio. Tarefa que se tornou bastante árdua pois íamos de carro.

Foi um final perfeito para o filme perfeito: acabar numa maca, com uma enfermeira nada atraente e carrancuda a tirar-nos palitos das nádegas, enquanto ainda murmurávamos um para o outro, entre-dentes, "Eu é que sou o Raízo, AU!".